domingo, 27 de março de 2011

Descrição

Eu costumava ter medo do escuro. Não que eu o tenha superado, vira e mexe me vem aquela nostalgia em qualquer breu repentino. Mas eu não tenho mais aquele receio de ir ao banheiro no meio da noite ou de abrir o olho quando o ar-condicionado desarma e me acorda. Acho que era só uma questão de costume.
Medo é um desses sentimentos que vem carregados de incertezas, mas a partir do momento que familiariza-se, muda de nome. Eu sempre fui um pouco receosa quanto a incertezas e pouco cética nesse quadro. O escuro sempre foi uma dessas incertezas. Quando eu to no escuro eu fico mais cautelosa; é como se tudo ao meu redor se reduzisse a uma expansão monocromática e só reconhecida ao tato. É meio normal sentir a cautela como resposta a qualquer coisa que precise ser sentida para re(se)conhecer; é normal pra mim.
Não sei exatamente como tudo se encontra, mas sei onde estão. Como se eu levantasse meus braços assim que eu apagasse a luz do abajur pra dormir e só soubesse que eles estão ali porque fazem parte de mim, mas só os visse como um amontoado de sem-cores.
Demanda um pouco de tempo, mas logo o escuro vai tornando-se composições de cinza e luzes da rua num jogo de silhuetas reconhecíveis; e fica mais claro. Claro demais ao ponto de se fechar os olhos para realcançar o escuro não acostumado. Só porque a incerteza as vezes é mais confortável e acostumável que qualquer certeza imprevista, mesmo pelo medo.

O escuro mais escuro. O escuro claro demais. É só questão de costume ao que não se vê e ao que se está acostumado a ver.

quinta-feira, 17 de março de 2011

Interlúdio

(Não me olhe escrevendo)
Me encontro no egocentrismo da metalinguística à noite, dividindo palavras soltas com a luminária presa ao teto do meu quarto e água e sais com o travesseiro, que me acompanham até dormir. Eu gosto muito de falar sozinha. Digo, eu falo muito sozinha, eu devo gostar de falar sozinha pra fazer isso com frequência.
Minha própria companhia me é agradável, momentaneamente. Não tenho de ter a preocupação de ser coesa ou não repetitiva pras prateleiras. Não me respondem. Nem me pedem pra explicar. Só tento ser coesa pra mim mesma.
Parece mais fácil que pras outras pessoas. Vejo sentido onde ninguém enxerga. Mas as vezes passa tão desapercebido que o mundo todo o cumprimenta, menos eu. Culpo a desatenção. Ou a minha indiferença quanto a quase tudo. Me distraio com qualquer ideia e esqueço de falar. Ou desisto de falar. Não vou insistir em apresentar sentido pra quem não o quer cumprimentar, fica uma situação meio chata e irritante.

Tipo não escutar até o final músicas consecutivas; porque não se sabe exatamente o que se quer escutar; mas sabe que se quer escutar alguma coisa ao invés de nada.