sábado, 14 de maio de 2011

Da mesmice em prosa

No trânsito, caracterizado no habitual de sempre. Os mesmos carros, as mesmas luzes, a mesma bossa de buzinas... não. É uma má relação do conjunto arrogante de buzinas com a mistura de sons tão confortáveis. Estaria mais pra um samba mal ensaiado, rebaixado e mal tocado. E como aquela música ruim mais tocada naquela rádio que não se pode desligar quando já se está de saco cheio do ritmo do mundo, acostuma-se e se aprende a ignorar o costume.
Ainda é sempre o mesmo trajeto, com o mesmo transito habitual das 18h, os mesmos carros, as mesmas luzes, o mesmo samba mal ensaiado de buzinas aflitas por escapar do universo do fim de tarde.

Nos ônibus, são as mesmas pessoas diferentes, ignorando as presenças de sempre acostumadas a compartilhar a inconstância dos pneus no asfalto desgastado da cidade. Dividindo o espaço em pé com uma bolsa cá, um espirro lá, uma mochila aqui e a cada ponto de ônibus o silêncio do mundo pressiona meus ouvidos. E é desconfortável dividir um espaço tão pequeno com pessoas anônimas, que se atem nem mesmo ao pensamento pra não ocupar mais espaço.
É incomodo o abismo entre alguém tão próximo no balanço inconstante do universo do fim de tarde no ônibus. Seguimos o mesmo trajeto para o mesmo destino por alguns instantes -quando o que se quer perde a especificidade, é mais fácil de achar interesses semelhantes, como o de querer chegar em casa, simplesmente.
Ainda no trajeto de sempre, no mesmo transito caracterizado, dividindo o asfalto desgastado com os mesmos carros, com as mesmas luzes e prestigiando com desgosto do mesmo samba mal tocado de buzinas com interesses em comum.

É entediante. Mas é o tédio acostumado que se aprende a ignorar.

Eis que se arranja um acento para descansar da mesmice de cada dia posta sobre os ombros, e pensar sobre outra coisa que tome lugar na sua cabeça do acento que você estava mentalizando conseguir há alguns momentos.
Mesmo rodeado de pessoas, de nomes anônimos, de histórias, de silêncio, se considera sozinho. Dividindo o momento com a inércia do ônibus, o banco do ônibus e a janela molhada de chuva do ônibus, com pensamentos em função exponencial. Sozinho como a falta de presença. Melancolicamente sentindo a presença da falta. Mas sem estar acompanhado da tristeza.
É como ser uma estrela em um céu urbano à noite. Parecendo solitária por conta das luzes das ruas. Parecendo solitária à distância.

Como se sentisse em um ônibus sem ponto final. Em um texto sem conclusão.

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